domingo, 29 de julho de 2007

Príncipes e princesas em uma terra de incertezas

Resenha do filme Príncipes e princesas

Juracy dos Anjos

Quem nunca sonhou em encontrar seu príncipe ou princesa, pares perfeitos e encantadores dos romances? Quem nunca ouviu falar em uma história de plebéias que encontraram seu príncipe encantado após passarem por provações absurdas?

Ou de corajosos guerreiros que salvaram suas princesas aprisionadas em masmorras, guardadas por dragões ou bichos medonhos? Acredito que nove em cada dez meninas, e, porque não meninos, de várias idades, fenótipos e classes sociais, já escutam estes contos na infância e desejaram um príncipe ou princesa para suas vidas.

Mas tem uma coisa que tenho quase certeza que ninguém nunca imaginou: que o príncipe ou princesa, fora do mundo ideal, pode ser imperfeito como qualquer ser humano comum.

Na animação do francês Michel Ocelot, Príncipes e princesas (título original: Princes et princesses, origem/ano: FRA/1999, duração: 70 min, legendas: português), uma revolução no modo de contar e apresentar esta lendária história de amor entre príncipes e princesas acontece.

A narrativa, em formato de teatro de sombras – técnica milenar China -, com silhuetas animadas, é contada por uma garota e um garoto que encenam fantásticas peças de teatro, auxiliados por um velho diretor, que conduz as histórias com sabedoria.

Os jovens criadores e criaturas se transformam em herói e heroína de seis histórias e viajam para todos os cantos do mundo, indo do passado ao futuro distante, através de uma máquina do tempo.

A animação apresenta também um universo de elegantes e encantadoras figuras que encantam crianças e adultos de todas as idades, mostrando a beleza do Antigo Egito, a poesia da arte japonesa, o romance da Idade Média e os prodígios do ano três mil.

O elenco, que dá voz aos personagens, é composto por Arlette Mirapeu, Philippe Cheytion, Yves Barsacq e François Voisin. A tradução para o português fica por conta das vozes de Giulia Gam, Othon Bastos e Ernesto Piccolo.

Com um discurso que desconstrói os estereótipos clássicos e valoriza a particularidade dos indivíduos, com seus defeitos que não são poucos, mas humanos, o filme conduz o espectador a uma reflexão profunda sobre cânones eternizados nos romances históricos e atuais.

Todos os contos estimulam à inventividade, ao companheirismo, à solidariedade e ao respeito à diferença. As personagens femininas ganham destaque, em especial, nesta perspectiva. Embolsa também a força de decidir o rumo das suas vidas e quebra a suposta fragilidade da mulher.

No canto O Casaco, por exemplo, que compõe uma das seis histórias, a velha gueixa japonesa nos mostra que a sabedoria da idade supera a força física da juventude. Dona de um casaco cravejado de pedras preciosas, a velha mulher, ao voltar para sua casa, é vítima de uma assaltante, que tenta roubá-la após se passar por bom rapaz.

O jovem se oferece para levá-la nas costas para que não se canse, em virtude da idade avançada e da aparece fragilidade física. A mulher aceita e elogia a bondade do jovem, ensinando o caminho da sua casa.

Mas o jovem não segue o caminho ensinado e desvia para um local deserto. Lá, ele inicia a tentativa de roubo. A gueixa, ainda moutado nas costa do jovem, se recusa a entregar o casaco e demonstra toda sua força, apertando-lhe as costelas. O jovem se curva à força da mulher. Ela então o obriga levá-la a vários locais que não poderia ir sem a força física do jovem assaltante.

Após longa e cansativa trajetória e a satisfação plena da velha mulher, o rapaz, arrependido, recebeu o casaco de presente. Esta construção demonstra um dos valores que a animação preza que é o merecimento. Quem dera que todas as animações infantis pudessem trazer esta reflexão.

FILMOGRAFIA - Presidente do ASIFA (Associação Animated Internacional da Película), Michel Ocelot já foi diretor, escritor, desenhador da produção, ator, Cinematographer, editor e Self. Como diretor de animação, Ocelot fez Kirikou et sauvages dos bêtes dos les (2005), que trata da história do pequeno africano intrépido chamado Kirikou, saído sozinho da barriga da mãe para conquistar o público do mundo inteiro.

Outras obras também fazem parte do legado do cineasta, como Voeux de Quatre, Les (1987), Bossu de Légende du pauvre, La (1982), Inventeurs de Trois, Les (1980), dentre outros.

O que falta para escrever minha crônica

Juracy dos Anjos

Como escrever uma crônica? Falar sobre o que quando se tem uma imensidão de assuntos e problemas que podem ser debatidos e questionados em nossa cidade e até mesmo, ou principalmente, em nosso país? Não. A pergunta não é esta, falta o mais importante. Mas o que será? Talvez falte saber a linguagem a ser utilizada. Ou para qual público será feita a crônica. Não sei, acho que isso ainda não responde os meus anseios. Não acredito que seja esta a principal dúvida ainda.

Bem que Rubens Alves falou que escrever doe como se tivéssemos um furúnculo. Esta dúvida sobre o que falta para começar a escrever esta crônica está me matando. Acho que o melhor, assim como para curar os males e dores da vida e física, é parar um pouco e procurar alguma remédio, neste caso descansar a mente. Quem sabe mais tarde quando voltar saberei o que é que está faltando.

Dez minutos depois, após tomar um café quente e fumar cinco cigarros Hollywood, e de abrir a geladeira “n” vezes para buscar sei lá o que, volto à frente da máquina ainda com a maldita dúvida na cabeça: o que falta para começar a escrever esta crônica. Abro a gaveta, ao lado da máquina, e pego uns textos, que me deram menos trabalhos para conceber. Entre eles estão reportagens e contos literários.

Nossa! Este último gênero me lembra uma história bacana para fazer uma crônica. O conto conta, valendo-me da liberdade poética, por isso, não censure a redundância, a história de um garoto que tenta quebrar o tédio do cotidiano com uma viagem de ônibus.

Ele pega uma condução que o leva para o famoso bairro do Pelourinho. Ali na Cruz do Carmo, mas todo mundo conhece na verdade como Cruz Caída. A vista do pôr do solar de lá é linda, quase que perfeita. Já sei, vou escrever minha crônica sobre a Cruz Caída e este menino. Mas a dúvida inicial continua, apesar de saber qual é o assunto que vou falar.

A linguagem já descobri também, vou misturar um pouco dos dois gêneros que gosto de fazer: a literatura e o informativo. O público será todos que se interessem pelo tema.

Mesmo após definir tudo isso me falta algo que não sei explicar o quê, falta a essência, apesar de não acreditar em essencialismo. Assisti um dia uma palestra em que um professor de antropologia dizia que não tínhamos uma personalidade em formato de caroço de abacate, essencialista, mas sim como um repolho, com múltiplas fases.

Acredito nisso. Mas isso não tem nada a ver com a questão que me atormenta.

Meu Deus, o que é uma crônica?

Hum! Boa pergunta.